quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Alguém tem alguma dúvida?

Na minha curta experência como professor, já percebi que a frase acima é quase um convite ao silêncio. Ela me lembra um ditado que é muito popular lá na minha casa: "Quem oferece não quer dar". Explico: sabe aquela anfitrião que fica falando sobre o Black Label que ele tem guardado e fica perguntando se as visitas querem? Na maioria das vezes, encabuladas, as visitas acabam declinando. Se quisesse mesmo tomar o uísque (ou bourbon para os puristas, diz minha cultura de orelha que Jack Daniel's não é uísque) teria já trazido aberto, de preferência dentro dos copos.

Não tem coisa pior para o professor que o silêncio da classe. Nesse silêncio cabe todo tipo de elocubrações e fantasias, os alunos podem estar entendendo perfeitamente, não entendendo nada, sequer prestando atenção ou um pouco de cada coisa.

Também notei que uma turma nova, ainda não familiarizada ou segura o suficiente com o professor, tende a interromper somente para corrigir ou perguntar sobre o que estão copiando da lousa. Na matéria que eu ensino, representei a perturbação em um sistema de controle de temperatura como uma perda de calor. Até aí, nada demais. Entretanto, representei essa perda com uma seta que entrava no sistema, subtraindo do calor fornecido pelo forno. Ao copiar o esquema, um aluno não entendeu direito aquilo e mandou a pergunta: "Ué, se o calor sai, a seta não deveria ser para fora?". Foi a minha primeira pergunta de aluno, uma pergunta interessante, pertinente, que depois de um bom tempo de aula quebrou aquele silêncio tão constrangedor.

Fiquei pensando se os professores não poderiam usar isso como método para quebrar o gelo com seus alunos. Na hora de explicar os seus esquemas colocados na lousa, deixar de explicar certos pontos de propósito, ou ainda deixar certos ovos de Páscoa espalhados pela matéria, só para gerar diálogo com os alunos. Talvez aquela frase dita pelos nossos professores, em tom de brincadeira, ao apontarmos erros na exposição não seja de todo mentira. "Queria só ver se vocês estavam prestando atenção".

5 comentários:

Anônimo disse...

Oi Alim, li suas motivações para criar esse blog, e fiquei também pensando nas minhas motivações para eu mantero meu. O blog é um meio de auto-conhecimento. Nele podemos expressar nossos pensamentos e sentimentos, e isso nos leva a entender melhor os fatos do cotidiano.. Mas também queremos ser ouvidos. Gerar “bate-papo” entre os comentaristas é talvez o sonho de todo autor. Mas isso exige cuidado: Quando escrevemos, precisamos pensar que não há garantia nenhuma de que alguém vá ler aquilo, e muito menos de que vá comentar. Então, nossa atitude deve ser paradoxal: desejar comentários sem esperar por eles. Beijos. Fa.

Anônimo disse...

Por minha também curta experiência como professora, pude aprender que nossa pergunta "alguém tem alguma dúvida" é de certo modo forma de projeção. Nessa hora, a dúvida é nossa: Nós professores temos dúvida se estamos mesmo ensinando bem, se estamos ou não sendo aceitos, e projetamos nossa angústia nos alunos perguntando se eles têm dúvida. Eu percebo que nas aulas em que eu mais pergunto isso, eu estou com essa dúvida mais presente. Ah, e para mim, que não consigo ver a expressão dos alunos, o silêncio que sucede a essa pergunta é desesperador. Beijos.

A. disse...

Geniais os comentários da Fabiana.

Anônimo disse...

Oi Alim ! Ia responder por email, mas resolvi escrever aqui mesmo pra te agradar... vc merece !!! ;) Eu acho (muito baseado no que aprendi com a Carla sobre didática) que o modelo de aula frontal é coisa do passado. Hoje em dia, na era da Internet, SMS, Orkut etc., a aula tem que ser muito mais interativa e gerar muito mais participação dos alunos. É muito bonito e muito fácil falar, mas na prática também não faço a mínima idéia de como fazer isso. Só posso dizer uma coisa: "Think outside the box!" (deixei em inglês de propósito em homenagem ao nosso amigo a.). Uma das teorias atuais (pelo que me disseram) diz que a função do professor não é "enfiar" o conhecimento na cabeça do aluno, mas ajudar o aluno a construir esse conhecimento a partir das bases que cada um deles possui. Nesse processo, é muito importante que o professor tenho consciência dessas bases antes de começar a aula e tentar sempre fazer um link com esse conhecimento, para que o conhecimento faça algum sentido para o aluno.

Enfim, queria falar que partilho da sua preocupação didática e sugiro que formemos um "grupo de estudos" para discutir essas questões e tentar fazer melhor esse difícil papel de professor.

Grande abraço,


DISCLAIMER: o autor acima não tem nenhuma formação no assunto e não conhece absolutamente nada sobre o que está dizendo. Tudo está baseado em conversas com pessoas que entendem alguma coisa da área... :D

alimped disse...

Zá,
Não se preocupe em não ser especialista no assunto, o Leitor de Orelhas foi criado para isso mesmo. O nome já indica que eu quero falar das coisas que eu ouvi dizer, li na orelha dos livros, etc. Sem culpa!

Eu admiro quem consegue conduzir uma aula assim dialogada, socrática. Por enquanto eu não tenho conseguido...Lembro que alguns professores da faculdade achavam que estavam fazendo diálogo socrático, quando na verdade estavam querendo que a gente respondesse a coisa certa. Achava isso tão irritante que nem tento fazer...

Quanto a aproveitar o conhecimento dos alunos, é uma coisa que venho tentando fazer, mas também é difícil, pois o nó é fazer os alunos se abrirem. Eles tem vergonha e por vezes preguiça de trabalhar nessa direção. Ouso dizer que preferem a aula mastigada à aula com o cérebro ligado.

Fico esperando a resposta dos meus outros dois leitores que são professores universitários e ainda não comentaram...Aliás, dado o perfil dos meus seis leitores, o grupo de estudos pode ser aqui mesmo :)